Fomos conhecer o centro de receção de pneus em fim de vida da Veolia, localizado em Loures, na área metropolitana da Lisboa. Na ocasião, entrevistámos Sandra Silva, Diretora de Resíduos na Veolia Portugal, que nos explicou a abrangência das atividades da Veolia, que
Sandra Silva (na foto, página ao lado, juntamente com Paula Correia, Responsável pelo Centro Operacional de Loures), explica-nos que “a Veolia é uma multinacional francesa e tem principalmente três áreas de atuação: resíduos, energia e água. Contamos com cerca de 800 pessoas em Portugal e o nosso core é a área ambiental. As três áreas que referi, cruzam-se com tudo o que tem a ver com ambiente, sustentabilidade, descarbonização, entre outros temas cada vez mais relevantes.
O propósito da Veolia resulta em cinco vertentes principais que são: o planeta, a comunidade, os acionistas, os clientes e os trabalhadores. Dito assim, parece igual a todas as empresas que se apresentam na área da sustentabilidade, mas a diferença da Veolia é que isto é aplicado na prática, todo os dias, em todos os aspetos da empresa.
Por exemplo, na aprovação de investimentos, não temos de responder apenas à parte económica, e sim como o investimento cumpre com cada uma dessas cinco dimensões. Basta não cumprir com alguma delas e o investimento não é aprovado.
A Veolia quando aborda um projeto de descarbonização, por exemplo, faz uma abordagem transversal à empresa, de forma a conseguir abarcar todas as soluções que permitam chegar ao objetivo da descarbonização.
Presença alargada
Em termos de setores, atuamos naqueles que são os mais impactantes para o ambiente, e aí entra claramente a indústria automóvel. Além dessa, temos a química e farmacêutica, alimentar, papel e pasta de papel, entre outras.
Na área da energia, temos dois setores que são complementares: a produção de energia elétrica, com painéis fotovoltaicos e cogeração – como são os casos dos Hospitais São João, de Loures ou o da Ilha Terceira, entre outros. Fazemos também toda a manutenção dos edifícios, desde o sistema de ar-condicionado, rede elétrica, e restantes utilities.
Na área das águas, realizamos todo o tipo de tratamento de águas com grande enfoque na sua reutilização. Temos tecnologia e patentes para tratar inclusive os casos mais complexos em termos de tratamento e reutilização de águas.
Na área dos resíduos, gerimos quase todo o tipo de resíduos, quer com centros próprios (como é o caso de Loures), quer estarmos com as nossas equipas na fábrica de um cliente, e gerimos todos os seus resíduos. Temos instalações em Loures, em Algoz, em Silves, Santa Maria da Feira, Aveiro.
Também gerimos os resíduos municipais, onde temos atualmente o contrato com a Câmara Municipal de Aveiro, para fazer a recolha dos resíduos no município. Realizamos também uma parte da recolha seletiva da ERSUC em Coimbra e Aveiro. Gerimos o ecocentro de Aveiro, onde temos conseguido testar alguma criatividade e inovações no âmbito dos comportamentos da comunidade, como mercados da troca, workshops, entre muitas outras atividades.
Gestão dos resíduos
Em 2022 processamos cerca de 180 mil toneladas de resíduos totais, dos quais, cerca de 3 mil toneladas foram pneus usados e em fim de vida. Dessas 180 mil toneladas, cerca de 60% não vai para aterro, pois seguem para reciclagem (valorização material) ou para CDR-combustíveis derivado de resíduos, sendo queimados nas cimenteiras em substituição de combustíveis fósseis.
Os pneus em fim de vida são recolhidos nos nossos armazenamos e, depois, encaminhamos para as unidades da Valorpneu, sejam elas unidades de recauchutagem, reciclagem ou de valorização energética.
É a Valorpneu que faz essa gestão, sendo que nós fazemos a recolha dos pneus e armazenagem. Os pneus podem ter duas origens: os pneus recolhidos nos operadores, e os pneus dos veículos em fim de vida (VFV) que chegam às nossas instalações. Nestes VFV, a Veolia para além de retirar os fluidos e outros resíduos, também retira todos os pneus.
Já a armazenagem é feita consoante a tipologia dos pneus e consoante o destino deles. Por exemplo, para a recauchutagem, os pneus são organizados de forma diferente daqueles que vão para a reciclagem. Temos uma ligação forte com a Valorpneu. A Veolia comprou a empresa Renascimento, e pelo que sabemos, a Renascimento esteve nos primeiros momentos da criação da Valorpneu em Portugal. Damos assim continuidade ao bom trabalho realizado.
Abordagem transversal
A Veolia procura fazer uma abordagem global a uma empresa e não apenas focada numa determinada área. Numa determinada empresa, todas as áreas estão interligadas e influenciam o desempenho energético e nas emissões conjuntas da organização.
Por exemplo, realizámos um estudo global a uma empresa da área industrial, onde aferimos a origem da produção de emissões, que no caso da eletricidade (iluminação, máquinas produtivas, ar-condicionado, entre outros), representava apenas de 6% do total das emissões. A grande maioria das emissões era originária da sua frota de veículos e equipamentos, ou seja, da utilização de gasóleo. Por isso, poderíamos “encher” a empresa de painéis fotovoltaicos, mas isso no limite resolveria apenas 6% das emissões.
Esta visão macro é necessária para se tomar as decisões que terão mais impacto. É preciso avaliar as opções de investimento e com uma vertente global conseguimos apresentar diferentes cenários, prioridades e fases de implementação. É uma análise mais estruturada e com mais conhecimento de base.
O facto de sermos uma multinacional, permite-nos ter um conhecimento muito alargado das diferentes soluções implementadas e os seus resultados. Há geografias onde a Veolia opera, que estão muito avançadas na área da energia, outras mais na área dos resíduos, e assim por diante, onde são gerados conhecimentos e aprendizagens à escala global. Isto dá-nos um conforto e uma segurança para abordarmos os mais variados projetos, onde certamente alguém no grupo já acumulou expertise nessa área e pode-nos auxiliar de forma célere.
Por vezes até conseguimos auxiliar as autoridades em Portugal, com exemplos concretos que dispomos em termos ambientais em outros países, e assim dinamizamos o trabalho e os contatos entre diversos intervenientes. A interpretação da legislação nesta área do ambiente nem sempre é linear, mas facilmente conseguimos solicitar esclarecimentos aos nossos colegas na Europa, para compreender melhor uma determinada legislação europeia, por exemplo. O facto de termos uma grande massa crítica e presença em vários países, permite-nos abordar com segurança os desenvolvimentos que são feitos.
Evolução do setor
A área ambiental está a evoluir de forma rápida. Para se acompanhar essa evolução, quer em termos tecnológicos, quer em termos de legislação, é necessário uma grande estrutura empresarial, como é o exemplo da Veolia.
Entrei para a área dos resíduos em termos profissionais em 2003 e, à época em Portugal, tínhamos acabado de encerrar as lixeiras que existiam. Até aí não existiam aterros, apenas lixeiras. Recordo-me que a primeira triagem que existiu para o ecoponto amarelo era um tapete com funcionários a separar os resíduos, onde o único equipamento existente era um eletroíman que retirava as latas ferrosas. Nesse tempo as triagens funcionavam a cerca de 1 tonelada por hora. Hoje, o nível tecnológico é impressionante e já realizamos triagens a trabalhar a 8 toneladas por hora.
Portugal ainda tem muita coisa para mudar na área dos resíduos, tanto a nível da legislação como a nível estratégico do setor. Há muito para se fazer, mas também já muito foi feito. Gosto de olhar sempre para o futuro, mas faz sentido relembrar o passado e valorizar o que de bom foi feito à altura.
Próximos tempos
Neste ano de 2023, queremos enquanto Veolia continuar a crescer, principalmente na verticalização das nossas atividades. Queremos chegar a mais clientes e mais indústrias, quer na descarbonização, quer em outras metas importantes para o ambiente, apresentando uma solução abrangente e não apenas focada em determinada área.
Iremos continuar o programa de desenvolvimento de competências dos nossos trabalhadores, com o programa de novas oportunidades, onde já formamos vários trabalhadores com o 9º ano e com o 12º ano. Outra formação que iremos manter é o “português para estrangeiros”, porque temos muitos trabalhadores que vêm de fora e ainda não dominam o idioma português.
Uma das grandes inovações que estamos a trabalhar em Portugal através de um projeto-piloto é na captura de carbono. Muitas fábricas não conseguem resolver o problema da descarbonização, a não ser através da captura. Este trabalho além de pioneiro, tem tido uma grande repercussão internacional na Veolia, o que nos deixa naturalmente orgulhosos.
No segmento dos resíduos, queremos verticalizar mais as atividades. Nos casos onde entregamos os resíduos a destinos finais, iremos procurar soluções alternativas para o tratamento desses resíduos. Uma parte importante é ir buscar os resíduos, mas tão ou mais importante do que isso é o que fazemos com eles. É aqui que iremos evoluir e crescer, apresentando mais soluções para os nossos clientes.
Novos resíduos – baterias de lítio dos automóveis
Também estamos a estudar a reciclagem das baterias de lítio dos automóveis, num projeto que reúne Portugal e Espanha. Já estamos a desenvolver contactos para encontrar a solução mais adequada para um resíduo que se prevê aumentar nos próximos anos. Também nos próximos anos vai haver outro resíduo complexo, que são as pás eólicas que ainda não têm destino. As primeiras pás eólicas estão a chegar ao seu fim de vida e apesar do mercado ainda não ter dimensão, espera-se que, tal como as baterias de lítio, comecem a ter cada vez mais expressão ao longo do tempo.
Nos Estados Unidos da América, as pás eólicas já começam a ter destino, e a Veolia faz parte do grupo de empresas que está a avançar com uma solução. Estamos a ir para além da valorização energética, porque os componentes das pás eólicas, depois de triturados, substituem uma parte dos componentes que a indústria cimenteira utiliza no seu processo de fabricação de cimento. Ter matérias-primas para incorporar na cadeia de valor é uma das melhores soluções que se pode encontrar para os resíduos em geral.
Tanto as baterias, como as pás eólicas são temas que estão a emergir no mundo e não apenas em Portugal. Sendo a Veolia uma empresa com presença global, estamos confiantes de que conseguiremos proporcionar as melhores práticas e soluções adequadas para as nossas cinco vertentes: os trabalhadores, os clientes, os acionistas, a comunidade e o planeta”, finaliza Sandra Silva.